quinta-feira, 20 de junho de 2013

A subida das senhoras lusitanas ao palco olímpico

«Senhoras nos Jogos (Olímpicos)? Nem pensar. Seria algo inestético e indecoroso!» A frase pertence a Pierre de Coubertin, o homem que fez renascer as Olimpíadas na Era Moderna, e que fez lei (olímpica) a ideia de que a participação do sexo feminino nos Jogos era descabida e proibida! «Para elas a graça, as sombrinhas, o lar, o encanto dos filhos,... jamais o desporto. Uma olimpíada feminina não seria prática, nem interessante, nem estética, nem coerente, seria indecorosa!», deixava bem claro o Barão de Coubertin. E se as palavras não chegavam, os atos comprovaram a mentalidade de Pierre em bloquear os caminhos das renascidas Olimpíadas às senhoras, já que logo na primeira edição dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, realizados em 1896, na cidade de Atenas, uma mulher, de nome Melpomema, apresentou-se na linha partida para a maratona. Uma mulher no meio de homens! Rapidamente, e por ordem do barão, a dita senhora foi escorraçada debaixo de uma chuva de insultos, levando mais tarde Pierre de Coubertin a reforçar a sua ideia de vetar os Jogos Olímpicos ao sexo feminino dizendo que «Nos Jogos as mulheres só têm uma nobre missão: a de coroarem os vencedores com uma grinalda». Mas nem todos - no universo desportivo daqueles longínquos dias - partilhavam dos ideais de Coubertin. Nas Olimpíadas seguintes, em Paris (1900), o barão foi colocado de parte pela organização do certame, isto é, pelo governo francês, a quem o Comité Olímpico Internacional delegou - por incapacidade económica - a tarefa de erguer a segunda edição dos Jogos. Governo esse que fez do evento desportivo um mero e quase despercebido apontamento paralelo à Exposição Universal que naquele ano deu ainda mais brilho à Cidade Luz (Paris). Pois bem, com Pierre de Coubertin fora do controle das operações a organização abriu a porta dos Jogos às senhoras! 21 mulheres entraram assim para a história, para desespero do barão!

Esta é uma pequena sinopse dos primórdios do Olimpismo da Era Moderna, onde o desporto era um espaço permitido frequentar apenas aos homens, graças à sua virilidade e força. Uma regra, ou ideia, que - felizmente - foi sendo destruída a pouco e pouco ao longo dos anos que se seguiram, sendo que em algumas nações mais fechadas à liberdade de expressão física - digamos assim - feminina demorou um pouco mais. Em Portugal, por exemplo, seria preciso esperar cerca de 50 anos - após a primeira participação feminina nas Olimpíadas - para vermos portuguesas a competir no grande palco olímpico. Tal aparição deu-se em 1952, em Helsínquia, cidade que recebeu Dália Cunha, Natália Cunha, e Laura Amorim, as três primeiras deusas olímpicas da história de Portugal.

Elas integraram uma comitiva de 79 atletas que a bordo do navio Serpa Pinto representaram as cores de Portugal nas Olimpíadas de Helsínquia. Eram ginastas de créditos firmados a nível nacional, talhadas para a modalidade desde tenra idade, sobretudo as irmãs Dália e Natália Cunha, cativadas para a prática desportiva pelo progenitor, um desportista fanático que jogava râguebi, praticava natação, fazia atletismo, e ainda tinha tempo para praticar tiro. As manas Cunha - Natália era mais velha que Dália um ano - cresceram e também elas tornaram-se viciadas na prática desportiva. Desde o atletismo, passando pelo tiro, e acabando na ginástica, só para citar algumas modalidades em que competiam, as manas - nascidas em Lisboa - tornaram-se figuras de cartaz do masculino cenário desportivo português daquele tempo. Seria precisamente a ginástica a modalidade que as tornaria imortais, já que a par de Laura Amorim, apresentaram a mulher lusitana ao planeta do desporto internacional. Contudo, na capital finlandesa a concorrência foi feroz, como comprovam as modestas classificações obtidas. Dália, com 23 anos de idade na época, foi a melhor das três damas lusas, ao conquistar um 108º lugar na classificação final. A sua irmã não conseguiu ir além do 133º posto, sendo que Laura Amorim seria 124ª classificada.

Para Dália Cunha a aventura olímpica teria um novo capítulo, oito anos mais tarde, em Roma, onde voltaria a ficar abaixo (foi 109ª) das 100 melhores ginastas do torneio olímpico de 1960.
A par da ginástica as irmãs Cunha colocaram os seus dotes desportivos ao serviço do atletismo, sendo que a meio da década de 40 integraram a equipa feminina de atletismo do Sporting, onde conquistaram diversos títulos regionais e nacionais em diversas variantes.
Dália ainda deu cartas no ciclismo, na patinagem, e nas corridas de automóveis!

Legenda das fotografias:
1-Elenco feminino da comitiva de Portugal na partida para os Jogos Olímpicos de 1952
2-Dália Cunha, que a par da sua irmã, Natália, praticou ginástica no Ginásio Clube Português
3-Equipa de atletismo feminina do Sporting na temporada de 45/46, onde podemos ver as irmãs Cunha em destaque (Da esquerda para a direita Natália é a primeira e Dália é a terceira, enquanto no meio está Hedi de Sá)

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Um ano de vida!

Parece que foi ontem, mas o tempo não perdoa e um ano passou desde que o Museu Virtual do Desporto Português abriu oficialmente as suas portas aos entusiastas do fenómeno desportivo. 
9 de maio de 2012 foi pois a data em que o sonho foi tornado realidade, o sonho de recordar e eternizar nestas vitrinas virtuais as páginas mais cintilantes do nosso desporto, escritas por homens e mulheres que com o seu talento ganharam muito justamente o estatuto de lendas imortais. Um ano - celebrado precisamente hoje - que passou a correr, e muito, mas muito, pouco foi ainda aqui evocado, ou não fosse Portugal uma nação de caminhos múltiplos no que à glória desportiva concerne. E são precisamente esses caminhos que ainda se encontram por trilhar que nos comprometemos desde já a percorrer no futuro imediato, convidando desde já o ilustre visitante a embarcar connosco nestas empolgantes viagens ao passado.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Sporting Clube Caminhense: Viveiro de campeões!

«Encravada entre o rio Minho, o rio Coura e a montanha e situada à vista do oceano, Caminha tem uma situação geográfica priveligiada em termos de variedade de belezas naturais», frase da autoria de João J.R.T. Azevedo que em poucas palavras traça o perfil da charmosa vila minhota erguida bem no norte de Portugal. Belezas naturais que transformaram esta pituresca localidade num autêntico ex-libris a diversos níveis, inclusive o desportivo. Neste patamar Caminha é de há longas décadas a esta parte um verdadeiro viveiro de campeões daquela que muitos consideram como uma das duas modalidades - a outra é a vela - mais antigas a ser praticada no nosso país, o remo. Reza a história que esta modalidade terá sido iniciada no imenso oceano que envolve grande parte do território português por volta do ano de 1828, pela mão de Abel Power Dagge, que muitos apontam como o primeiro desportista náutico a sobressair em Portugal. Nesse longínquo 1828 Dagge - descendente de ingleses radicados em Lisboa - fundou o Arrow Club, e a ele atrai algumas figuras oriundas da aristocracia nacional da época, que deram então vida às primeiras regatas nos mares lusitanos, mas ainda de uma forma puramente lúdica. Pela palavra do historiador José Pontes a primeira regata oficial ocorrida em Portugal remonta apenas ao ano de 1849, tendo sido promovida precisamente por Abel Power Dagge. Rapidamente as corridas sobem ao patamar da popularidade, e ficam célebres a partir da década de 50 do século XIX as regatas de barcos à vela e de remos realizadas por alturas dos festejos anuais de Paço de Arcos, promovidas por grupos de aristocratas da época - alguns deles ligados inclusive à Casa Real - e por elementos oriundos da colónia inglesa radicada em território luso. 

As regatas ganham vida com o passar dos anos, e em 1855 nasce - pela mão do inevitável Abel Power Dagge - a Real Associação Naval (RAN). Mais a norte 1866 é apontado como o ano em que as regatas começaram a despontar naquela região, atribuindo-se à elite inglesa radicada na cidade do Porto a fundação do primeiro clube destinado à prática da modalidade, o qual dava pelo nome de Oporto Boat Club, nascido a 20 de junho de 1868. Oito anos mais tarde nasce o Clube Fluvial Portuense, ainda hoje um dos nobres embaixadores do remo nacional, e que atualmente carrega consigo o título de clube mais antigo de Portugal! Depois destes, outros clubes e associações ligadas à modalidade surgiram um pouco por todo o país, sendo que em 1884 acontece - mais uma vez por iniciativa de Abel Power Dagge - o primeiro campeonato realizado em Portugal. Certame que foi disputado no Rio Tejo.
De berço elitista o remo e a vela rapidamente se democratizaram, isto é, fixaram também as atenções das classes mais baixas. Prova disso foi uma célebre regata ocorrida em Cascais, em 1896, na qual marcaram presença o rei D. Carlos - um profundo entusiasta do desporto, de um modo geral - e a sua esposa, rainha D. Amélia. Organizada pela RAN a regata ficou histórica pela forte adesão de público. Rezam as crónicas que cerca de 6 000 pessoas visionaram aquele que é considerado por muitos como um dos primeiros grandes eventos desportivos que ocorreram no país.

Bom, mas voltando ao início da nossa história, isto é, bem ao norte de Portugal, dizem os historiadores que a prática do remo em terras minhotas terá começado em Viana do Castelo, por volta de 1910, por intermédio do Viana Taurino Clube. Agremiação que dois anos mais tarde criou a Taça Viana Taurino Clube, competição que dali em diante reunia no Rio Lima os principais clubes de toda a região norte do país. Uma competição que de certa forma ajudou a enraizar - e sobretudo dinamizar - o remo naquelas bandas. Uma das localidades que de pronto se renderam à modalidade foi Caminha - até, não será de mais repetir, pelas suas excelentes condições naturais para a prática da mesma. As primeiras regatas vistas nesta bela localidade terão decorrido no Rio Coura em meados dos anos 20. Seria precisamente nesta década que vê a luz do dia o Sporting Clube Caminhense, filial número 49 do Sporting Clube de Portugal fundada no dia 14 de dezembro de 1926. Os primeiros anos de vida terão sido dedicados ao futebol e ao ténis, tendo o remo sido introduzido no clube pela mão de Manuel Augusto Fernandes já na década de 30.

Sporting Clube Caminhense coloca... Caminha no mapa nacional e internacional

De lá para cá escreveu-se então uma história brilhante, repleta de conquistas, muitas, que tornaram Caminha numa lenda do remo português. Mais do que lenda esta localidade tem sido um verdadeiro viveiro de campeões, de homens e mulheres que vivem apaixonadamente uma modalidade que se tornou no maior ícone desportivo caminhense. E tudo pela mão do Sporting Clube Caminhense, um grande do remo nacional, senão mesmo o gigante da modalidade no presente. O sucesso do Caminhense começou a escrever-se bem cedo, quando em 1936 e 1937 conquista a Taça Stadium, no Porto. Desde então foram diversos, centenas para sermos mais precisos, os títulos regionais e nacionais alcançados pela principal personagem do desporto de Caminha. Só para citar uma meia dúzia dessas centenas de títulos recordamos que este é o clube com mais títulos na Taça Lisboa - prova sucessora do tal campeonato nascido em 1884 por iniciativa de Abel Power Dagge -, 27 para sermos exatos (!), tendo o primeiro sido alcançado em 1939. Títulos nacionais são às... centenas, tendo o primeiro sido conquistado em 1941 (nas categorias de sheel de 4 e sheel de 8 disputadas no Tejo). Quatros anos mais tarde vence mais uma série de títulos nacionais, os quais são abrilhantados pela primeira conquista internacional, o campeonato ibérico de shell 4. No ano de 1960 arrecada a Taça Infante D. Henrique, título que faz com que o Presidente da República de então, Américo Tomás, se desloque a Caminha para homenagear o clube. Três anos mais tarde o Caminhense cruza o Atlântico para participar na II edição dos Jogos Luso-Brasileiros, ocorridos no Rio de Janeiro (Brasil), tendo conquistado o título em shell de 8. Em 1982 recebe da Direção Geral dos Desportos a Medalha de Bons Serviços Desportivos, e muitos, muitos outros títulos e galardões que enchem de orgulho as simpáticas gentes de Caminha.

Presenças nos Jogos Olímpicos

Como viveiro de notáveis e talentosos campeões ao longo dos seus quase 90 anos de vida, foi com naturalidade que o Caminhense viu alguns desses seus delfins atingir o almejado palco olímpico! A primeira aparição do Sporting Clube Caminhense nos Jogos Olímpicos - sim, podemos dizer assim - aconteceu em 1948, em Londres, quando este emblema forneceu à comitiva portuguesa que se deslocou à capital britânica os cinco atletas (!) que integraram a equipa nacional que participou nas provas de remo. Notável. Eternos são pois os nomes de José Cancela, José Seixo, Delfim Silva, António Torres, e Leonel Rego, que na categoria shell de 4 atingiram os quartos-de-final da prova olímpica, muito perto de chegar a uma medalha.
Doze anos volvidos, nas Olimpíadas de Roma, o Caminhense voltou a transformar-se, digamos assim, na delegação lusitana que competiu nos Jogos, já que os cinco atletas lusos - nomeadamente José Vieira, José Porto, Jorge Cravinho, Ilídio Silva, e Rui Valença - pertenciam aos quadros do emblema de Caminha!
Seriam precisos mais 32 anos para que a vila minhota pudesse voltar a ver um filho seu marcar presença no maior evento desportivo do planeta, altura em que João Santos foi um dos dois remadores que defendeu a bandeira de Portugal nas Olimpíadas de Barcelona. Quatro anos mais tarde, em Atlanta, foi a vez de João Fernandes e Henrique Baixinho defenderem a nação lusitana nos Jogos, tendo ambos feito parte da equipa que alcançou um 15º lugar na variante de shell de 4

O maior remador português de todos os tempos é de Caminha... e do Caminhense

Chama-se Henrique Baixinho, e é para muitos dos experts da modalidade o maior remador português de todos os tempos. Também ele é um produto do Sporting Clube Caminhense, emblema onde deu os primeiros passos numa modalide onde foi rei. Nasceu precisamente em Caminha, no ano de 1961, sendo que para além do clube da sua terra natal representou ainda o ARCO (de Viana do Castelo), o Clube Ginásio Figueirense, o Clube de Regatas do Flamengo e o Clube de Regatas Vasco da Gama, estes dois últimos da cidade do Rio de Janeiro (Brasil). Do seu impressionante palmarés constam cerca de uma centena de títulos nacionais (!), divididos entre Portugal (78) e o Brasil (17). Com as cores nacionais o seu primeiro momento de glória aconteceu em 1989, quando no Campeonato do Mundo conquistou uma medalha de bronze juntamente com Luís Fonseca, Luís Teixeira, e José Leitão (na categoria quadricull). No entanto, o ponto mais alto da sua brilhante e ímpar carreira aconteceu em 1996, nos Jogos Olímpicos de Atlanta, onde, como já vimos, integrou a equipa nacional que alcançou um 15º lugar na variante shell de 4. 

Legenda das fotografias:
1-Emblema do Sporting Clube Caminhense
2-Uma das primeiras imagens (data desconhecida) do remo em Portugal
3-Alguns dos primeiros remadores do Caminhense
4-A equipa que se deslocou ao Rio de Janeiro para disputar os Jogos Luso-Brasileiros de 1963
5-Subidas ao pódio, um ritual no dia a dia do Caminhense
6-Henrique Baixinho, o maior ícone do remo português


quinta-feira, 28 de março de 2013

O "doutor" das damas lusitanas

Modalidade de cariz intlectual, o jogo das damas tem - em Portugal - atraído a si um elevado número de praticantes, que nas décadas mais recentes colocaram este jogo de tabuleiro em altos patamares de popularidade. Têm sido pois muitas as competições ocorridas em solo lusitano, onde largas dezenas de jogadores vindos dos quatro cantos do país travam entre si emocionantes e intensos duelos, mas um desses damistas tem-se destacado entre os demais.  
No mundo das damas é tratado por “doutor”, uma designação que o próprio desconhece a razão de existir, mas que ao olharmos de relance para o seu rico e extenso palmarés se fica facilmente a perceber o porquê da atribuição de um título tão pomposo. Vaz Vieira, ou melhor, “doutor” Vaz Vieira, assim é que é, considerado de forma unânime no “planeta” das damas como o melhor jogador português de todos os tempos. Com ele cruzei-me há tempos num dos muitos opens que já leva na sua longa e gloriosa carreira, e numa breve troca de palavras pude ficar a conhecer ao pormenor o historial desta lenda - já ganhou por direito próprio esse estatuto - nascida há 69 anos (no ano de 1943) em Guimarães, mas que de há umas décadas a esta parte faz de Coimbra o seu lar. 

No desfiar da nossa conversa recordou o passado, o seu passado glorioso ao serviço de uma modalidade pela qual se apaixonou ainda menino, numa altura em que os lares portugueses estavam ainda despidos das novas tecnologias – com a televisão e os computadores à cabeça – e como tal os serões em família eram passados com a saudável e alegre disputa de jogos tradicionais, como o rami, o abafa, o xadrez, ou as damas. A modalidade que o tornou célebre foi-lhe apresentada pelo pai, também eles um grande jogador, o pai que o fazia chorar sempre que o vencia, e logo depois o espicaçava com o seu triunfo. Mas como em tudo na vida Vaz Vieira é uma pessoa persistente, foi aprimorando a sua técnica mental de jogo, e chegou a uma altura em que o próprio progenitor já não o vencia. 

Ainda deambulando pelo passado viajou até Moçambique, onde viveu grande parte da infância, junto dos seus pais, e onde vivenciou outra paixão desportiva, o futebol. Ao serviço do Benfica de Lourenço Marques foi mesmo campeão provincial, tendo mais tarde aquando da sua vinda para a metrópole integrado a equipa de juvenis da Académica de Coimbra, onde foi treinado pelo lendário mestre José Maria Pedroto. Por Coimbra ficou. Estudou na mítica universidade da cidade do Mondego, a mesma universidade onde desenvolveu a sua carreira de docente, e orientador de estágios. Em Coimbra casou, sem nunca esquecer a paixão de infância pelas damas, aliada à paixão entretanto travada com a Briosa.

Nas damas tornou-se então o campeão dos campeões. Ao longo de décadas somou títulos atrás de títulos. 
Venceu 10 campeonatos nacionais seguidos, ao que se seguiu uma paragem de outra dezena de anos por motivos de saúde, e quando voltou novamente à ação foi de novo campeão! Detém um impressionante registo - até à data - de 86 vitórias em opens nacionais, número que nenhum outro damista se atreveu sequer a ameaçar. 
No plano associativo foi um dos fundadores da Federação Portuguesa de Damas, em 1980, onde hoje assume a função de presidente da mesa da Assembleia Geral. Do seu currículo constam ainda dois pomposos títulos de campeão do Mundo de damas clássicas, e muitos outros títulos conquistados em épocas em que a federação ainda não havia visto a luz do dia.

Impressionante, de facto. O segredo deste sucesso? Responde que é o trabalho, aliado ao gosto pela modalidade, de jogar somente pelo prazer, pelo prazer de jogar e não jogar pelo prazer de ganhar. 
Para si as damas são um desporto de grande beleza, nas suas palavras poucos jogos haverão com a beleza deste, capaz de proporcionar combinações fantásticas, um jogo onde se podem construir problemas com muito poucas peças, e problemas com muitas pedras e com dificuldade extrema. 
O fim da carreira ainda bem longe, pois continua enamorado por este jogo, deixando os títulos e as vitórias de lado, até porque há muito que já não é isso que o motiva a continuar.

Vídeo: Mestre Vaz Vieira durante um jogo 

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

O pai do surf português

Geograficamente presenteado com mais de 1200 km de costa marítima, Portugal cedo tirou proveito desta riqueza natural para se evidenciar nas modalidades desportivas praticadas em alto mar, com realce para a vela, sendo que nunca é por demais recordar que em 1856 foi fundado pelo rei D. Pedro V o primeiro clube da Península Ibérica dedicado às regatas. Vela que com o passar dos anos haveria de tornar-se - como temos vindo a fazer eco em anteriores visitas ao Museu Virtual do Desporto Português - num autêntico alfobre de campeões... campeões da Europa, do Mundo, e Olímpicos!
Mas nem só para a prática de vela o extenso mar lusitano tem sido aproveitado. Outra modalidade bem popular em terras lusas é o surf, um desporto - radical - de enorme espetacularidade onde Portugal tem colecionado alguns brilharetes, não tantos como na vela, é certo, mas que enche naturalmente de orgulho esta nação à beira mal plantada. E a história do surf português cruza-se inevitavelmente com a de Pedro Martins de Lima, um homem que muitos consideram o pai do surf português.

Oriundo de uma família de cavaleiros Pedro Martins de Lima veio ao Mundo a 14 de setembro de 1930, não sendo de estranhar que os seus primeiros passos no desporto tivessem sido dados no hipismo, modalidade que começou a praticar com apenas 6 anos de idade. Não muito tempo mais tarde deixou-se encantar pelos fascínios do mar, interessando-se pela vela, e pela pesca submarina, última modalidade esta que entretanto começa a praticar. No limiar da primeira metade do século XX descobre então uma das paixões da sua vida, o surf. Estavamos em 1946, uma época em que a modalidade de origens havaianas era totalmente, sim, é verdade (!), desconhecida num Portugal que durante séculos e séculos viu nascer centenas de aventureiros do mar. Face à inexistência de material essencial à prática da modalidade em Portugal, Martins de Lima iniciou o seu legado de rei dos mares lusitanos com a prática de bodyboard, usando para o efeito uma prancha rudimentar e umas barbatanas que um amigo lhe trouxera do estrangeiro.

Até que em 1959 consegue finalmente adquirir uma prancha de surf, para posteriormente se lançar ao mar. Sem companhia nesta aventura ele cimentou no nosso país uma modalidade que hoje em dia agrega em si milhares de praticantes. Mas nem sempre foi assim. No início Pedro Martins de Lima recorda - em inúmeras entrevistas dadas nos tempos mais recentes - que «naquele tempo era preciso ter coragem para surfar ondas grandes, mas também para enfrentar as consequências. Cheguei a ser preso por entrar no mar revolto. Os cabos-de-mar prendiam-me, mas os banheiros intercediam a meu favor porque já tinha salvo muita gente no mar. Era um país de marinheiros que não sabiam nadar»!!!
A bravura e insistência do surfista furou inúmeras ondas de resistência, e se o surf é hoje em dia uma das modalidades mais praticadas em Portugal a ele o deve, ao pai do surf nacional.

Vídeo: REPORTAGEM COM PEDRO MARTINS DE LIMA 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Portugal "nada entre (alguns) (d)os tubarões" do pólo aquático europeu

Mais de meio século depois de ter vivido o seu momento de glória no plano internacional - com a presença nos Jogos Olímpicos de 1952, em Helsínquia, facto este já aqui recordado numa anterior visita ao passado - o pólo aquático português voltou já no novo milénio a figurar no cartaz oficial de uma competição de alto gabarito além fronteiras. Facto ocorrido em meados de 2004, altura em que a seleção portuguesa de seniores masculinos marcou presença em Istambul (Turquia) para participar no Campeonato da Europa "B" de pólo aquático, uma espécie de segundo escalão, a nível europeu, desta modalidade.

Pela razão de que esta foi a primeira presença lusa numa prova deste calibre a própria qualificação para a mesma constituiu desde logo uma das páginas mais brilhantes escritas pelo selecionado principal no nosso país. Fase de qualificação essa que decorreu curiosamente em solo português, mais concretamente em Rio Maior, sendo que ao lado de Portugal apareciam os combinados da Suíça, Moldávia, e República da Irlanda na luta por um dos três mágicos lugares que garantiam o passaporte para a Turquia.

Teoricamente a luta - renhida - pelo terceiro e último lugar de apuramento iria ser protagonizada por portugueses e irlandeses, até porque os moldavos eram claramente de outro campeonato - muito superior -, e assim sendo praticamente insuperáveis, ao passo que os suíços surgiam no patamar imediatamente abaixo do conjunto de leste, pelo que o segundo lugar não lhes deveria fugir. Com toda este panorama o Portugal - República da Irlanda da jornada inaugural da fase de qualificação assumia contornos de uma autêntica final. E assim foi.

Orientados tecnicamente por um dos nomes mais sonantes da história do pólo aquático português, Nuno Lobo, Portugal entrou na competição com um misto de convicção e de... nervosismo. O salgueirista Rui Moreira, um dos melhores intérpretes da modalidade da história, em termos nacionais, claro está, falhou logo nos minutos iniciais uma grande penalidade, aumentando assim os nervos entre o selecionado luso. A partida arrastava-se de uma forma equilibrada, de vencedor incerto, até ao momento em que apareceu o inspirado Hugo Florêncio - jogador do Amadora -, que com dois golos num curto espaço de tempo colocou Portugal em vantagem no marcador, vantagem essa que seria segurada até final, com muita garra, há que dizê-lo. 7-4, histórico resultado final, que praticamente colocava os portugueses no Europeu, até porque era impensável que a frágil Irlanda levasse de vencida quer a Suíça, quer a Moldávia.

Nas 2ª e 3ª jornadas desta fase a teoria confirmou a prática, ou seja, Portugal perdeu ante a Moldávia (2-5) e a Suíça (11-14), últimas duas seleções estas que derrotariam igualmente sem grandes dificuldades a República da Irlanda, e assim sendo a seleção nacional lusa fazia história, a fase final do Campeonato da Europa "B" era uma realidade.

Para a história ficam aqui os nomes dos conquistadores de um feito que na altura passou... completamente despercebido à nação lusitana! Nuno Lobo (selecionador nacional), Nuno Paz (Diretor Técnico), Tiago Costa, Rui Nuno (ambos guarda-redes), Ricardo Vieira, Gonçalo Abrunhosa, Jorge Coelho, Jaime Milheiro, Rui Coelho, Hugo Florêncio, António Grácio, Gilberto Lobo, Rui Moreira, Paulo Russo, Nuno Portela, e Carlos Azevedo.

Inexperiência ditou leis

Entre 3 a 11 de setembro Istambul recebeu então a fase final do certame continental, que pela primeira vez contava com Portugal. País que olha o pólo aquático de uma maneira algo... desinteressada, há que dizê-lo, e como tal há que sublinhar que o feito deste grupo de entusiastas praticantes da modalidade foi verdadeiramente heróico!

Claramente num nível - muito - abaixo de seleções como a França, Bielorrússia, Ucrânia, ou Moldávia, a seleção lusa - cujos atletas eram semi-profissionais - partia para Istambul com a intenção de aprender algo com jogadores de outro nível, jogadores profissionais que vivem e respiram o pólo aquático diariamente, e não como os lusitanos que se apresentavam nesta fase final com quase nenhumas sessões/estágios de preparação (!), face à sua condição de atletas não profissionais.

Portugal foi integrado no Grupo B do torneio, juntamente com Dinamarca, Malta, Polónia, Israel, e a turma da casa, a Turquia. No primeiro encontro, ante os polacos, logo se percebeu que os portugueses iriam ter muitas dificuldades para escapar ao último lugar da competição, conforme traduz a pesada goleada de 1-12 imposta pelo conjunto de leste. Rui Coelho apontou o tento de honra lusitano.
Na ronda seguinte foi a vez da forte seleção de Malta provar a inexperiência portuguesa nestas andanças, ao vencer os selecionados de Nuno Lobo por concludentes 14-4. Portugueses que acusavam nervosismo face a atletas experientes e bem treinados, e Dinamarca e Israel também não sentiram - grandes - dificuldades em vencer a armada lusa. Ante a seleção da casa Portugal deu finalmente um ar de sua graça, e mesmo perdendo a contenda por expressivos 4-12 mostrou qualidade, mostrando que a sua presença entre alguns dos tubarões do pólo aquático europeu não havia sido mera obra do acaso.

Na fase cruzada entre os grupos A e B, para apurar a classificação final, Portugal lutava para fugir ao último lugar. Uma luta onde a sorte abandonou a equipa nacional, em especial no jogo ante a Bélgica, com quem os portugueses empatavam a quatro golos a poucos minutos do final, dispondo de uma oportunidade flagrante para passar para a frente do marcador, mas... mais uma vez o nervosismo e inexperiência ditaram leis, e os belgas acabariam por vencer por 7-4. O derradeiro jogo foi com a Suíça, e uma derrota vendida de forma muito cara por uns curtos 4-5 ditou que Portugal terminasse esta aventura no último lugar de uma competição que seria ganha pela poderosa França.

No entanto esta foi uma experiência memorável para nomes como Nuno Lobo (selecionador), Jorge Martins (treinador), Nuno Paz (Diretor Técnico), Rui Nuno, Tiago Costa, Paulo Russo, Jorge Coelho, Nuno Portela, Rui Moreira, Rui Coelho, Jaime Milheiro, Hugo Florêncio, Ricardo Vieira, Gonçalo Abrunhosa, Carlos Azevedo, e Gilberto Lobo.

Legenda das fotografias:
1-O histórico selecionado português que em Rio Maior conquistou a qualificação para o Europeu "B"
2-Nuno Lobo, histórico jogador/treinador que comandou os lusitanos nesta aventura